sexta-feira, 14 de abril de 2017

A crise política e a distopia tropical

Por Olímpio Cruz Neto

O país já não se escandaliza nem reage aos desmandos cometidos, aqui e ali, pelos principais atores no centro do palco da política nacional. Caricatos, os homens que comandam a República fingem uma normalidade institucional que vulgariza a política e atropela o bom senso. Tudo em nome dos novos tempos e dos brados de uma redução fiscal que faça do Orçamento uma ponte para o século 19.

No Congresso, enfia-se goela abaixo do povo uma sucessão de reformas que destroem o futuro e fulmina as esperanças da construção de um país mais justo. No Judiciário, os principais agentes públicos – juízes e procuradores – trocam insultos e ofensas, sem ficarem ruborizados com as desfeitas cometidas em nome da Justiça, enquanto fingem não ver desfeitas e ilícitos confessados.

No governo central, Michel Temer e seus ministros se confraternizam em convescotes com a elite econômica, tramando a retirada de direitos e a destruição do Estado brasileiro e da já bulímica política de bem estar social. Tudo em nome dos agrados ao mercado, que se ufana da queda da inflação e proclama novos cortes, enquanto a recessão campeia e já provoca o desemprego de 13,5 milhões de brasileiros.

Nas ruas, o povo parece descrente. Nem a classe média brasileira, que foi às ruas nos últimos dois anos para pedir o impeachment de Dilma e vestiu Lula de presidiário, sabe bem o que quer. Basta ver o fiasco das últimas manifestações nas principais cidades brasileiras. Paira no ar a descrença. Ainda mais com a chamada Lista de Fachin, que fulmina a imagem de conservadores que tanto arrotaram o pomposo discurso de que o mal do Brasil foi o lulopetismo.

Aécio Neves, Geraldo Alckmin, José Serra, Aloizio Nunes Ferreira... Os próceres do tucanato escondem o bico sujo de propinas, enquanto espalham as penas e fingem que continuam acima da moral. No PMDB, Michel Temer, Romero Jucá, Renan Calheiros, Moreira Franco e Eliseu Padilha surgem inteiros nos detalhes de reuniões nebulosas, marcadas por um pedágio de US$ 40 milhões.

Os descrentes olham para Dilma, mas resistem a ver o óbvio. A presidenta eleita por 54,5 milhões de votos foi deposta para franquear a máquina do Estado para as tenebrosas transações dos velhacos que se esgueiram para dividir o botim e vender o país. E Lula, o timoneiro que veio do povo, mesmo arranhado pelas denúncias requentadas em torno de pedalinhos, um sítio e um apartamento no Guarujá, ainda segue na lembrança do povo como o maior presidente do Brasil. Alvo de uma campanha difamatória sem precedentes, que ofende sistematicamente sua história, Lula ainda lidera a corrida presidencial.

Há chances de que o establishment se desfaça do hospedeiro no Planalto, privando Michel Temer do mandato, e definindo por via indireta um nome para comandar o país. Pelo menos um aventureiro se inclina e mostra-se à disposição das elites e da velha plutocracia brasileira: Gilmar Mendes. Ele quer e deseja ocupar o poder sem intermediários.

Chegou a hora de tirar o povo da letargia e reacender a esperança. O risco da descrença na política é o país repetir como tragédia a farsa que vivenciou no passado, quando a ilusão do salvador da pátria levou ao Palácio do Planalto um outsider. Não é possível correr novamente tal risco. É hora de ganhar as ruas e pressionar pela antecipação das eleições diretas.

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